Acentuação gráfica, para quê?

Por Betto Ferreira

A acentuação gráfica (ou marcação gráfica) cumpre apenas uma finalidade: a de indicar, quando escrita a palavra, o som tônico vocálico de uma de suas sílabas, aquelas que indicam se a palavra é oxitona, paroxitona ou proparoxítona, ou se um monossílabo tônico. Entenda-se por sílaba o conjunto de fonemas (= sinais sonoros) articulado numa só impulsão/articulaçção oral. Fora disso, essa marcação é prescindível, ou seja, pode ser desconsiderada pela ortografia do português. Até por que todo usuário dessa Língua sabe quando deve pronunciar /secretaria/ com o sentido de nome de profissão ou com o sentido de nome de lugar ou de verbo (secretariar). O problema está na escrita.
Para mim, apenas em caso de extrema dificuldade em diferenciar num texto escrito o sentido (=significado) da palavra, o que não ocorre com frequência na língua, é que se deveria fazer valer o acento gráfico. A situação a seguir, e ainda como frase isolada, seria um desses exemplo:

a) A secretaria ficou sozinha por um instante.

Como se pode ver, neste caso é quase impossível reconhecer o sentido da palavra em destaque. Daí a marcação gráfica (´) na sílaba tônica seria necessária para orientar o leitor do texto escrito quanto ao sentido da palavra, ou seja, de que se trata do nome da profissão (= aquela que executa serviços de secretariado) e não do lugar onde se executa os serviços. Mas creio que ocorrências como (a) em Língua Portuguesa ocorre muito pouco.
Por isso, como professor de Língua Portuguesa, há dez anos, e estudioso dos princípios lingüísticos, acho desnecessário o acento gráfico como marcador de tonacidade sonora. Mesmo nos chamados acentos diferenciais nunca achei necessário a marcação gráfica em palavras como pára (= verbo parar) para diferenciar de para (= preposição). Impossível o leitor não reconhecer os dois sentidos da grafia na situação a seguir:

b) O menino para a todo instante para comer.

Ou mesmo em situações como em

c) Para você João.

O contexto vai orientar para o verdadeiro sentido da palavra, com certeza. Ninguém iria escrever tal coisa fora de um contexto língüístico maior.
Agora, no caso de uma palavra cuja pronúncia não seja conhecida pelo usuário é só ensiná-lo como é que se pronuncia a tal palavra. Mesmo porque aprendi que há muito mais coisas a ensinar e a aprender em questões de linguagem que uma símples imposição normativa com relação aos sinais gráficos de tonacidade vocálica. Ainda bem que alguém está usando o bom senso com esta nova reforma (já confirmada pela imprensa na semana passada), embora ainda de forma muito tacanha. Volto a falar do assunto.

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