Adolescente: trabalhar para não ser bandido?

Por Betto Ferreira

Segundo um relatório (Juventude e Trabalho Decente na América Latina e no Caribe)divulgado hoje (04.09) pela OIT (Organização Internacional do Trabalho), os jovens da América Latina e do Caribe, entre 15 e 24 anos, enfrentam índices de desemprego muito maiores que os adultos. No total da massa de trabalhadores da região, de acordo com o relatório, os jovens dessa faixa de idade - 106 milhões, no total - representam 46% dos desempregados.
Como professor da escola pública há dez anos, um dado deste relatório é motivo de minha preocupação: o fato de 15 anos ser uma idade já inserida na medição do índice de desemprego. Um jovem entre 15 e 17 anos, além de estar na escola, não deveria estar praticando algum tipo de ocupação no período livre - algum tipo de lazer, esporte e/ou conhecimento técnico-profissional, por exemplo? Por que tem sido cada vez mais comum, mesmo nos meios pedagógicos, que o jovem pobre tenha que trabalhar sob o rsico de, não o fazendo, se tornar bandido? O jovem rico nessa faixa de idade trabalha, por acaso?
Outro dia, um dos meus alunos da 8ª série, 14 anos, se muito, disse-me que iria estudar à noite porque teria de trabalhar. Perguntei-lhe se ele tinha realmente necessidade daquilo. Ele respondeu que não, mas que era preciso trabalhar para que não se tornasse um bandido.
Diante da sua resposta, tive pena daquele meu jovem aluno, criança ainda submetido à censura absurda de não poder ser criança. Não é hora de se pensar mais a respeito da propaganda exagerada em torno do trabalho como a única forma de fazer do ser jovem um ser sadio? O trabalho efetivo do jovem, dos 15 aos 17 anos, não seria exatamente as atividades escolares (e o lazer), sendo os pais, pessoas adultas, bem remuneradas, responsáveis pelo sustento do filho até que este, na fase adulta, preparado estivesse para se manter, tanto financeiramente quanto intelectualmente?
Um jovem exposto à condição de um adulto exigirá sempre, e com razão, os direitos que são de direito dos adultos. Ou seja, um jovem que trabalha, vai certamente exigir que tenha a liberdade de impor condições, em especial aos pais. Dessa forma, não aceitará que estes lhe obriguem ir à escola, nem a fazer aquilo de que não gosta.
Acho que é preciso pensarmos em relação a isso. Temos de convencer o jovem de que a escola é a sua obrigação com vista ao seu projeto de ser cidadão, pois é seu futuro e do país (e do mundo) que estão em jogo. Se o jovem quer ser responsável (igenuamente muitos se julgam, embora não seja o que se constata em suas atitudes cotidianas), ele tem de estudar. Trabalho é coisa para pessoa adulta.

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