O fracasso do imperador
Por Betto Ferreira
Muito se discute hoje os desmandos da educação escolar. Mas, a meu ver, entre outras coisas, para que toda educação e/ou ensinamento surtam o efeito esperado é preciso, antes de tudo, que o outro acredite ou esteja predisposto a acreditar naquilo que temos a ensinar. Caso contrário, a intenção de educar/ensinar cai no abismo da escuridão, junto com toda a nossa ilusão de (in)competência que nos foi conferida pela sociedade.
Tal competência não é exclusividade somente de quem educa e/ou ensina, é também de quem quer ser educado e/ou ensinado. Como, de acordo com Olivier Reboul (Introdução à retórica, 1988), educar e/ou ensinar são atos praticados por meio da persuasão interativa, utilizando-se de argumentos ou atitudes argumentativas, toda educação ou todo ensinamento, em qualquer fase da vida, só terá efeito se o outro, ou seja, aquele a quem pretendemos atingir com nosso conhecimento, estiver predisposto a receber, com a devida importância, aquilo que ensinamos. E a predisposição de aprender, no caso da educação escolar, está acima do professor. Tem a ver com a cultura de valor de um povo.
Por uma ou outra razão – quem sabe por influência da educação doméstica, na adolescência; quem sabe por seu próprio interesse, quando adulto –, no caso do aluno do filme, alguma coisa fez dele um sujeito predisposto às idéias da ambição e da arrogância, por isso persuadido, desde cedo, a ser o homem ambicioso e arrogante, no que se tornou.
Os princípios morais e éticos presentes no discurso do professor podem até ter contribuído como reforço a posição contrária do rapaz - afinal, é em função do que o outro diz que formulamos nossas respostas, segundo as teorias da retórica clássica e moderna. Mas não foram suficientemente convincentes para que moldassem, muito menos mudassem, o seu caráter, como pretendia o professor.
Fracassados nos sentimos todos diante de situações como a que viveu Hundert. Não só nós professores, mas todos aqueles que lidam diretamente com questões de ordem emocional. Afinal, ao contrário do que se imagina, somos também sensíveis a emoções. Talvez por isso, pretendemos ainda muitas vezes, como foi o caso da personagem, assumir a figura do sacerdote, cuja missão é mudar o (des)caminho da vida de cada um. Em especial nos dias de hoje, quando se sabe que estão em evidências vários outros fatores sociais que concorrem diretamente ou indiretamente, e com maior peso, contra as matérias e disciplinas escolares, o sacerdotismo pedagógico é uma máscara que muitos insistem em usa-la. Vai ver que é porque nos falta alguém dizer que não somos os únicos responsáveis pelos problemas de ordem moral ou ética da humanidade.
Soluções paliativas como a receita da aprovação automática, a pretexto de evitar a repetência e o desestímulo, parece ter sido um remédio inadequado e extremamente perigoso. No filme, o professor tentou remediar o aluno ao forjar sua nota a fim de curá-lo da arrogância, a fim de torna-lo um imperador perante os outros alunos. O resultado, como se viu, foi dramático: além de arrogante, a exemplo do pai, o rapaz se tornou um homem ambicioso, um valor altamente maléfico à humanidade, quando utilizado de forma inadequado e que em nada contribua para o histórico social.
Portanto, mais que depressa, é preciso nos convencermos e convencermos também a sociedade e governos de que nem toda receita tem eficácia na cura de uma doença que é crônica – no caso da educação escolar, a doença da pobreza cultural e da ignorância. Infelizmente, não depende só de nós, os professores, ainda que fôssemos plenos de inteligências, que todo mundo chegue a ser um senhor Julio César. O imperador fracassou.
Muito se discute hoje os desmandos da educação escolar. Mas, a meu ver, entre outras coisas, para que toda educação e/ou ensinamento surtam o efeito esperado é preciso, antes de tudo, que o outro acredite ou esteja predisposto a acreditar naquilo que temos a ensinar. Caso contrário, a intenção de educar/ensinar cai no abismo da escuridão, junto com toda a nossa ilusão de (in)competência que nos foi conferida pela sociedade.
Em O clube do Imperador o professor de História, Willian Hundert, tenta a todo custo estimular um aluno ao gosto pelos estudos a fim de faze-lo um Sr Júlio Cesar*. Como não conseguiu mudar o que fora plantado no início da formação do caráter do aluno e com isso, quem sabe, transformar o seu destino, o professor se sentiu um profissional fracassado.
O drama do professor é, na verdade, uma metáfora do drama de todos nós, professores do chamado mundo moderno, que, por pressão da sociedade ou por ilusão da profissão, sente-se na obrigação de interferir na condição humana do outro. Trágico engano.Tal competência não é exclusividade somente de quem educa e/ou ensina, é também de quem quer ser educado e/ou ensinado. Como, de acordo com Olivier Reboul (Introdução à retórica, 1988), educar e/ou ensinar são atos praticados por meio da persuasão interativa, utilizando-se de argumentos ou atitudes argumentativas, toda educação ou todo ensinamento, em qualquer fase da vida, só terá efeito se o outro, ou seja, aquele a quem pretendemos atingir com nosso conhecimento, estiver predisposto a receber, com a devida importância, aquilo que ensinamos. E a predisposição de aprender, no caso da educação escolar, está acima do professor. Tem a ver com a cultura de valor de um povo.
Por uma ou outra razão – quem sabe por influência da educação doméstica, na adolescência; quem sabe por seu próprio interesse, quando adulto –, no caso do aluno do filme, alguma coisa fez dele um sujeito predisposto às idéias da ambição e da arrogância, por isso persuadido, desde cedo, a ser o homem ambicioso e arrogante, no que se tornou.
Os princípios morais e éticos presentes no discurso do professor podem até ter contribuído como reforço a posição contrária do rapaz - afinal, é em função do que o outro diz que formulamos nossas respostas, segundo as teorias da retórica clássica e moderna. Mas não foram suficientemente convincentes para que moldassem, muito menos mudassem, o seu caráter, como pretendia o professor.
Fracassados nos sentimos todos diante de situações como a que viveu Hundert. Não só nós professores, mas todos aqueles que lidam diretamente com questões de ordem emocional. Afinal, ao contrário do que se imagina, somos também sensíveis a emoções. Talvez por isso, pretendemos ainda muitas vezes, como foi o caso da personagem, assumir a figura do sacerdote, cuja missão é mudar o (des)caminho da vida de cada um. Em especial nos dias de hoje, quando se sabe que estão em evidências vários outros fatores sociais que concorrem diretamente ou indiretamente, e com maior peso, contra as matérias e disciplinas escolares, o sacerdotismo pedagógico é uma máscara que muitos insistem em usa-la. Vai ver que é porque nos falta alguém dizer que não somos os únicos responsáveis pelos problemas de ordem moral ou ética da humanidade.
Soluções paliativas como a receita da aprovação automática, a pretexto de evitar a repetência e o desestímulo, parece ter sido um remédio inadequado e extremamente perigoso. No filme, o professor tentou remediar o aluno ao forjar sua nota a fim de curá-lo da arrogância, a fim de torna-lo um imperador perante os outros alunos. O resultado, como se viu, foi dramático: além de arrogante, a exemplo do pai, o rapaz se tornou um homem ambicioso, um valor altamente maléfico à humanidade, quando utilizado de forma inadequado e que em nada contribua para o histórico social.
Portanto, mais que depressa, é preciso nos convencermos e convencermos também a sociedade e governos de que nem toda receita tem eficácia na cura de uma doença que é crônica – no caso da educação escolar, a doença da pobreza cultural e da ignorância. Infelizmente, não depende só de nós, os professores, ainda que fôssemos plenos de inteligências, que todo mundo chegue a ser um senhor Julio César. O imperador fracassou.
*Nome dado ao vencedor do concurso realizado na escola da história do filme.
Comentários
Quanto a sua referência à " receita da aprovação automática, a pretexto de evitar a repetência e o desestímulo", penso que precisa reciclar seu conceito sobre o tema recuperação continuada. Quem inventou "aprovação automática" foram os professores, pois o termo dispensa trabalho e preocupação com o aluno. Você sabia que nos países desenvolvidos não existe repetência? A conduta é tão obsoleta que só existe mesmo em países onde não há compromisso com o futuro das gerações. Eu fico impressionada com o grau de sadismo dos professores por defender tanto a repetência. E também o grau de ignorância e falta de autocrítica ao não se dar conta de que repetência do aluno é atestado de incompetência da escola e dos seus professores junto com toda a equipe envolvida.