Popularidade, crítica e rejeição

Como tudo que se torna público e popular (ao alcance do povo, geralmente através de muita luta), a educação escolar virou alvo de críticas e rejeições.

As críticas são de várias espécies e tendências. Mesmo quem não sabe nada do assunto faz a sua. Nas redes sociais, então, são uma quase obrigação. Afinal, é preciso estar em dia com a opinião pública. Pais e responsáveis legais, de costume, chegam a se esbaldarem.

Agora, incrivelmente, as rejeições vêm de quem mais precisa. Rejeita-se porque isso é está atualizado com a nova ordem. É preciso rejeitar o que se torna público-popular.

Em comum, o professor como bode expiatório do sistema. Uns inúteis. Parece até coisa de Rubem Alves. Mas é isso que se diz.

As críticas mais ostensivas, no entanto, porque vêm dos que menos precisa, são as que acusam os professores de cooptadores. Seres ideologicamente preparados para manipular os alunos. Todos uns comunistas e marxistas e, por serem assim, devem ser podados em suas pedagogias. Se é que as têm.

Se não fosse trágico seria cômico. Não me lembro de colegas tão engajados assim em assuntos de cunho ideológico – exceto os poucos indisciplinados como eu. Comunismo e marxismo na escola, a não ser como objeto de negação pela História.

Uma vez, quando eu era aluno do Colegial, apareceu um professor que nos sugeriu um livro chamado Capitalismo para Principiante. Acho que só eu li. Logo depois, ficamos sabendo que o professor fora transferido para uma missão religiosa. Foi o que disseram.

Eu só digo uma coisa: se eu tivesse (ou tivesse tido) o poder de cooptação que se supõe aos professores, ao menos grande parte dos meus jovens alunos teriam sido no mínimo poetas e/ou bons leitores de poesia. Camões, Vieira, Drummond e Vinícius, só para citar alguns, que o digam.

Mas é flagrante e notório que quem mais descreem os professores são os próprios alunos. Quem mais precisa. Não porque sabem o que fazem, mas porque pensam que sabem. Mesmo o professor que ensina certo, como concebe Freire, não inspira mais confiança aos jovens alunos de hoje (confiança teórico-ideológica, diga-se). No mínimo, se tornam bons ou maus interlocutores na relação ensino-aprendizagem.

“Ah, dá sua aulinha aê, ‘fessor". Jargões como este são muito comuns entre os alunos rejeitadores da educação popular na falta de argumentos outros (uma pena). Ou como este: “Nada a ver com a aula”, que dá a exata medida de quando o professor não terá sucesso ao se desviar do comum para ensinar certo.

Poucas vezes tive. A parada é ingrata. E olha que os meus desvios sempre tinham a ver com a aula. E como tinha. Tem ou não tem a ver quando o professor, incomodado com o não saber do aluno, o orienta sobre as várias possibilidades de expressão para dizer algo (variedade linguística)?

Tem ou não tem a ver quando, diante de atitude preconceituosa do aluno (pre-conceito aqui no sentido de não saber e conceituar), o professor se apossa de fatos e dados históricos para subsidiá-lo de competências (conhecimento)?

Concordo em parte com Ida Berger: o professor hoje é um ser manipulado que, acreditando ser livre, apenas aprende a manipular o outro (o aluno). Eu diria que nem isso mais. Nem para o bem nem para o mal. Como agente da educação popular rejeitada, o professor de hoje só tem servido à atenção do outro (o aluno) quando por ocasião da crítica.

Basta que para isso, em meio a tenção e a complexidade da profissão, deixe escapar um insólito palavrão como merda ou porra em sala, por exemplo. “O senhor tem de dá bom exemplo, professor”. Outro jargão comum à crítica da rejeição. Daí, toda a autoridade vai por água abaixo. Toda a competência adquirida ao longo dos anos também. E assim, nem ele mesmo acredita mais no efeito do que ensina (uma pena).

De minha parte, sério, nunca pensei em ser um bom exemplo de autoridade. Nem em sala nem fora dela. Sucesso nunca fiz nem tive. Vez ou outra recebi algum tipo de gratidão, é verdade. Mas sucesso, não. Quis ser apenas professor. Para mim, isso bastava. Não sei se consegui. Tentei. A parada da rejeição ao que é popular é ingrata.






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