A cigarra e a luta pelo trabalho
Cansado de cantarolar em
vão, pois já não era ouvido fazia tempo, uma cigarra macho do tipo carineta decidiu:
- Preciso fazer algo para
me garantir quando o inverno chegar.
Não queria passar pelo
vexame de mendigar como aquela mal falada cigarra dos tempos de outrora que não
tendo o que comer fora se humilhar à formiga por um nicho que fosse.
Mas o que fazer se só
sabia cantar? Pensou um bocado ante de emergir das trevas.
Viu um bando de
formigas trabalhadoras (isso é só uma coincidência) suprindo o formigueiro e se dispôs a ajudar
em troca de algum quinhão. Mas ouviu que havia excesso de contingente no cordão
e que fosse procurar outro algo para fazer.
- Posso cantar para
vocês enquanto trabalham? Perguntou, já levando os dedinhos às cordas do velho
banjo de quatro cordas, herança do seu tataravô.
- Não insista,
camarada, e veja se não nos atrapalha, o inverno tá logo ali.
Tirou de letra. Não
havia mal que já não tivesse espantado na vida desde que passara pela tormenta
da ecdise. Era preciso caminhar agora.
Adiante, deu com uma
nuvem de gafanhotos-soldado que patrulhavam a região na busca da melhor
vegetação para suprir a demanda. A cigarra logo se ofereceu para patrulhar
também em troca de algum retorno.
Mas de novo ouviu um
não como resposta. Daí propôs, já ajeitando o instrumento e estalando os dedos.
- Posso cantar uma bela
canção para alegrá-los enquanto patrulham.
- Ora, cigarra, desista
de nos iludir com cantigas, somos soldados, não está vendo? Vá procurar outro
que fazer pois o inverno está logo ali.
Nunca pensou que seria
fácil.
Já longe de casa, encontrou
uma colônia de cupins que devoravam um delicioso tronco de pinus-amarelo. Disse
que era bom comer ouvindo música. Os cupins o expulsaram, reclamando que não
tinha nada ali para uma cigarra, ainda mais para uma que só sabia cantar.
Um tanto caído, tentou
convencer um casal de louva-a-deus de que música fazia bem ao coito. Se deu mal. Se
tem uma coisa que louva-a-deus não tem é paciência com cantoria em qualquer
hora. Foi enxotada.
Chegou a flertar com a fêmea de um maribondo-caçador
para ser acolhido por ele na turma. Mas também não deu certo. Quase ele mesmo virou banquete da colmeia.
E o inverno era logo ali. E achar o que comer que
era bom, nada.
Antes de se dá por
vencido, foi atraído por um canto estridente que vinha de longe. Era um canto
belo como aquele que fazia antes da empreitada de sair a procura de trabalho.
Seguiu o canto.
Já era noite quando encontrou um bando de cigarras a cantar fervorosas
as mais lindas canções de toda aquelas terras. Todas felizes com o que mais sabiam fazer para viver.
Nem precisou pedir. Foi chegando e ali ficando também a cantar.
Nem precisou pedir. Foi chegando e ali ficando também a cantar.
Tinha seiva para todos.
Era só cavar.
MORAL DA ESTÓRIA: Toda
luta é inglória quando o que menos importa é viver.
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